29 de mai. de 2012

Aquele da higiene alheia

Hoje meu primo Valério veio aqui em casa. Valério era aquele tipo de criança encapetada que ninguém nunca achou que fosse dar certo na vida. Inclusive alguns anos atrás quando eu ainda estava no ensino médio a mãe dele estava tão cheia de problemas que, pra não ter que se estressar ainda mais que o filho, que não queria nada com a vida, o enviou aqui pra casa pra passar uma temporada, na esperança de que o meu pai, o bom e velho pai rígido, conseguisse dar um jeito naquela criatura pra ele virar gente. O tempo passou, ele já embarcou de volta pra casa dele e de vez em quando ele aparece.

Daí que hoje depois do colégio ele passou aqui pra almoçar.

"Vai lavar a mão antes de almoçar, moleque!", meu pai mandou, gritando.

"Que lavar a mão o quê! Lavar a mão pra quê?!"

"Você por acaso sabe por onde essa sua mão andou o dia todo?"

"Sei."

"VAI LAVAR A PORRA DA MÃO!"

"Tá, tá."

"COM SABÃO, VALÉRIO!"

"CARA, VOCÊ É MUITO CHATO!"

"LAVA DIREITO ESSA MÃO, ESFREGA COM FORÇA! TÁ COM MEDO DE ESFREGAR?! TÁ PARECENDO MULHERZINHA! VOCÊ É LADY?"

"LARGA DO MEU PÉ!"

"LAVA ESSA MÃO DE NOVO! TO MANDANDO! AGORA ENXÁGUA! NÃO, COM ESSA TOALHA NÃO, ELA É BRANCA, VAI DEIXAR ELA TODA PRETA!"

"É só porque eu sou preto, não é?"

"NÃO, É PORQUE VOCÊ É PORCO!"

26 de mai. de 2012

Aquele em que eu falo rápido demais

Não que eu concorde, mas minha mãe vive dizendo que eu falo meio rápido demais, só que na verdade eu considero a velocidade da minha fala num nível normal, não chega a ser exatamente um problema, o problema é a minha mãe que vive enchendo o meu saco querendo me obrigar a ir num fonoaudiólogo, dizendo que eu preciso ir num médico para resolver os meus problemas de fala porque ela reclama que as pessoas, ela principalmente, não entendem as coisas que eu digo, que isso pode ser uma deficiência provida de um gene familiar pois a mesmíssima coisa aconteceu algumas vezes na minha família, aconteceu com meu tio Lúcio e minha tia Neide que na adolescência falavam rápido demais e acabaram escolhendo resolver o problema de se atropelarem nas palavras que pronunciavam num fonoaudiólogo, mas eu não tenho vontade alguma de aprender a falar como eles porque, fala sério, eu não quero falar pausado que nem um idiota pronunciando cada palavra na velocidade da eternidade como se eu estivessse morrendo, porque é assim que meus tios aprenderam a ter o costume de falar depois do tratamento na fono e meu estilo de fala não dá pra ser assim, eu não sou lento, eu não gosto de lentidão, eu gosto das coisas rápidas, portanto minha vida seria muito mais fácil se minha mãe compreendesse isso e parasse de sugerir que eu faça tratamento, porque eu não preciso, eu realmente não preciso, que culpa eu tenho se às vezes ela ou as pessoas não entendem o que eu falo e eu tenha que repetir, não que eu repita né porque se tem uma coisa que me irrita é quando me mandam repetir algo que eu acabei de dizer, nossa me irrita muito, mas o que me irrita mais ainda é aquela maneira bicho-preguiça de falar porque, fala sério, aquilo não é vida, aquilo é atraso de vida, e a vida é muito curta pra ser atrasada, a minha mãe inclusive tem o mesmo "problema" que eu, ela vive reclamando que fala rápido demais também e que eu só aprendi a falar dessa maneira irregular por causa dela, por influência dela, mas eu não entendo o motivo dela achar que precisa ir numa fono, porque eu não preciso, não tem a menor necessidade, e se eu não preciso ela também não precisa, porque eu entendo o que ela fala perfeitamente bem, então se eu falo rápido porque cresci com minha mãe falando rápido demais e consigo entender tudo o que ela fala com perfeição, então, respectivamente, isso significa que EU não preciso de tratamento porque eu falo numa velocidade que dê para as pessoas entenderem, e ponto final.

24 de mai. de 2012

Aquele do chihuahua

Sabe, às vezes eu queria ser um chihuahua. Eu sempre vi o cachorro da raça chihuahua como aquele cachorrinho franguinho, pequenininho, o companheiro clássico de uma patricinha podre de rica. Um cachorro com um temperamento que absolutamente não faz juz ao seu tamanhinho de bolso.

Quer dizer, a imagem que eu tenho dos chihuahuas é de um animal totalmente histérico, se atropelando na sua condição mais-que-irritante com aquele latido esganiçado e impossível de se lidar. Imagino o chihuahua como um grande estúpido corajoso, bravo o suficiente para enfrentar os cães com o visual mais perigoso com relação a ele, sem a menor noção de que obviamente esses mesmos cachorros seriam capazes de estraçalhar o pobre do chihuahua em pedacinhos como se ele fosse uma meia velha. Vejo o chihuahua, principalmente, como um cachorro que apesar de tudo isso, não tem medo do que é, aparentemente, mais forte do que ele.

Não sei se eu chamaria isso de coragem ou de burrice, pra falar a verdade, mas eu admiro essa determinação absurda que o chihuahua detém. É quase poético.

Eu daria um ótimo chihuahua.
Mas puta que pariu, como eu seria irritante.

22 de mai. de 2012

Aquele do com ou sem emoção

Uma vez ou outra sempre acontece da gente ficar um tempinho esperando ônibus, né. Aqui no Rio é a desgraça. Comigo, pelo menos, acontece sempre. Isso deve ser karma, eu devo ter sido motorista de ônibus na vida passada, daqueles que saía sempre atrasado. Sabe aquela coisa de passar o seu ônibus no sentido contrário umas cinco vezes e NENHUM aparecer no sentido que você tá precisando? História da minha vida.

Num desses dias voltando pra casa eu devo ter ficado uma horinha básica esperando meu maldito ônibus. Uma hora, né. O basicão. Quando finalmente me chega o ônibus, todo mundo já tinha desistido e lá estava eu sozinho no ponto final, subindo no ônibus com o dinheiro na mão pro trocador, tentando ignorar o escândalo que o motorista estava fazendo berrando que não queria mais viver e que não aguentava mais sua profissão.

E foi então que ele resolveu falar COMIGO.

"E AÍ, COM EMOÇÃO OU SEM EMOÇÃO?", ele gritou pra mim, os olhos esbugalhados.

"Perdão. Eu não entendi."

"COM EMOÇÃO OU SEM EMOÇÃO, MOLEQUE?" ele repetiu, mais alto. Peraí, moleque?

Daí eu parei. Tentei pensar o mais rápido possível pra poder responder o mais rápido possível. Eu sigo uma filosofia que pra gente alterada eu tenho que responder rápido, com medo do que pode acontecer comigo caso eu fique calado que nem um idiota. O problema é que eu não consegui desenvolver uma resposta inteligente para devolver naquela situação.

"Sem emoção.", eu respondi finalmente.

"Ah, então é melhor você descer do ônibus, porque esse aqui vai ser com bastante emoção!"

Daí o que mais, né. Fodeu, é hoje que eu vou morrer. Foi o que eu pensei. E acho que por pouco foi o que não aconteceu. Aquele motorista doente deve ter ultrapassado uns cinco sinais vermelhos, fazia curvas que nem um louco e os quebra-molas então nem existiam pra ele. Foi o inferno. Eu me senti naquele filme em que as pessoas passam o filme inteiro trancadas dentro de um veículo sem freio em alta velocidade.

Mas bem que o motorista tinha razão, eu devia ter é descido, mesmo. Talvez esperar mais uma horinha pelo próximo ônibus não teria sido uma má ideia.

20 de mai. de 2012

Aquele da falta de material

Honestamente? O que eu mais queria agora era poder sair pra dançar e ficar louca de bêbada na pista de dança de qualquer boate gay nesse estado maldito que tenha bebida liberada. Mas não bebendo cerveja. Não. Cerveja não desce na minha garganta. Pra mim qualquer coisa é melhor que esse xixi com espuma que dão pra gente beber, até essas caipirinhas vagabundas feitas com kisuco de limão misturado com aquelas cachaças das mais baratas, sabem, daquelas que usam pra fazer oferenda de macumba.

Mas não. Eu tenho que ficar em casa, vendo a vida passar, esperando ficar melhor da saúde. Sentindo dor no corpo, entalado na cama assistindo qualquer merda que esteja passando na televisão ou algum filme/série que eu decida baixar para passar o tempo.

Eu quero sair, ver gente nova, voltar a estudar, saber das fofocas. Preciso das futilidades da vida pra sobreviver e, o mais importante, escrever sobre elas. Porque ficar empacado em casa não está me gerando material nenhum e eu já to de saco cheio.

13 de mai. de 2012

Aquele da tote bag

Um dia desses estava me arrumando pra sair e por uma questão de necessidade resolvi levar uma tote bag comigo porque não estava afim de usar mochila. Tote bag é tipo uma eco bag, não sei realmente o que difere uma da outra, mas enfim. Enfiei tudo o que precisava na maldita tote bag e a joguei no ombro, pronto pra sair. No big deal, afinal, eu canso de ver gente usando a tal bolsa por aí, seja homem ou mulher. Quer dizer, não que aqui no Brasil chova de caras héteros usando eco bags a torto e a direito, mas eu não diria que a imagem de um homem usando uma eco bag na rua faria sangue jorrar dos olhos das pessoas. Mesmo assim, como eu deveria saber, meu pai resolveu implicar.

Mamãe e papai estavam na sala assistindo a TV quando eu passei por eles.

"Que bolsa é essa, Alison?", perguntou meu pai, naquele tom irritante que só os pais sabem fazer, de deixar qualquer filho cheio de ódio.

"O que é que tem?", eu respondi.

"Deixa eu ver essa bolsa."

"Ah, pai, por favor, né."

"Você não vai sair com essa bolsa!"

"E quem é que vai me impedir?"

"Homem não é pra ficar andando com essa bolsinha, não! Isso aí é de mulher, você não vê?"

"Não quero saber."

"Alison, você NÃO VAI sair com essa bolsa."

"Ah, não? Me veja saindo com ela, então."

Me virei, e saí.


12 de mai. de 2012

Aquele da tirinha #021

Inspirado por B.
tirinha feita que nem a minha cara, porque já tava mais que na hora de atualizar essa bagaça, e eu estava morrendo de sono


5 de mai. de 2012

Aquele da abstinência sexual

Como eu ando doentinho (doentinho é apelido, mas ok), eu ando passando muito tempo no consultório fazendo coleta de sangue e lá aparece de tudo quanto é gente, né.

"Senhor, para fazer esse exame o senhor vai ter que ficar em abstinência.", informou a secretária.

"Abstinência? Que abstinência?", o velho perguntou.

"Abstinência sexual, senhor."

"Abstinência sexual? Mas que diabos é abstinência sexual?"

E foi então que minha mãe resolveu se meter.

"MINHA FILHA, FALA LOGO NO POPULAR! É SÓ ASSIM QUE ELE ENTENDE! NÃO PODE FAZER SEXO, MOÇO. ISSO QUE ELA QUIS DIZER, SEXO! VOCÊ NÃO PODE FAZER SEXO! ABSTINÊNCIA SEXUAL É ISSO. ENTENDEU?"

A secretária, toda envergonhada, deu uma risadinha.
Mas a boa coisa é que o moço finalmente entendeu e ainda aprendeu uma palavra nova no dia: Abstinência.

Mamãe é dez.

3 de mai. de 2012

Aquele do exame de fezes

E daí que a minha vida ultimamente tem sido um exame de fezes. Tipo, literalmente e figurativamente. E eu não aguento mais. Sábado passado eu passei super mal, fiquei de cama, e aqui estou eu, quase uma semana depois, ainda em casa, sentindo náuseas e dor no corpo o dia inteiro, esperando meus exames saírem para que meus médicos saibam finalmente que diabos eu tenho e tomarem alguma atitude.

Porque se tem uma coisa que eu odeio é ficar doente. Ficar doente é a abominação da minha vida, primeiro porque eu já tenho que obedecer limites por causa das minhas trezentas alergias. Quer dizer, eu tenho uma lista de restrições, cheia de coisas que se eu comer eu MORRO EM INSTANTES. Tipo, Zeus? Hermes? Afrodite? Qualquer um que esteja aí em cima. Não é o suficiente? Não é estrago o SUFICIENTE NA MINHA VIDA? Segundo que eu não suporto faltar aula. Pelo menos as importantes, né, porque a faculdade de Letras é infestada de disciplina inútil e repetitiva com professores mais inúteis ainda, mas isso a gente releva. O ponto é, o que é a minha vida sem estudar? Nada. Eu não faço NADA de útil, eu to a semana inteira assistindo a filmes e novelas japonesas o dia inteiro, torcendo pra não vomitar no edredon.

Quer dizer, não basta eu passar dias e mais dias do ano sofrendo com rinite, sinusite, falta de ar e o caralho a quatro, eu tenho que sofrer um pouco mais. 

Mas acho que a pior coisa no fim do dia é aquela sensação de ser uma mulher grávida no fim da gravidez, ficando enjoado por qualquer coisa e mijando a cada cinco minutos. E eu tenho um pinto! Sabe? Eu não devia estar sentindo isso. Eu não detenho a dádiva da menstruação (como diria nosso mestre Clodovil, que descanse em paz). Isso está sendo um martírio e eu não aguento mais ficar em casa. Eu até poderia arriscar ir para as aulas mas 1) Eu não vou viajar uma hora e meia, duas horas de ônibus passando mal lá dentro no meio daquele trânsito maravilhoso da avenida Brasil e 2) A comida do restaurante universitário é nojenta e eu não vou comer aquilo no estado que estou. Afinal, já basta eu ter de comer aquela gororoba quando eu estou BEM de saúde.